segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Cantiga de escárnio e maldizer no mundo contemporâneo

   Tendo como base os conceitos de cantiga de escárnio e maldizer (que faz crítica a algo ou alguém) podemos analisar esse tipo de cantiga nas canções da atualidade. Esse tema ainda é recorrente em músicas da nossa época? Aqui veremos que sim!
   Temos como exemplo a música "Que país é esse?" da banda Legião Urbana.

Nas favelas, no Senado
Sujeira pra todo lado
Ninguém respeita a Constituição
Mas todos acreditam no futuro da nação

Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?

No Amazonas, no Araguaia-ia-ia
Na baixada fluminense
Mato Grosso, Minas Gerais
E no nordeste tudo em paz

Na morte eu descanso
Mas o sangue anda solto
Manchando os papéis, documentos fiéis
Ao descanso do patrão

Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?

Terceiro mundo se for piada no exterior
Mas o Brasil vai ficar rico
Vamos faturar um milhão
Quando vendermos todas as almas
Dos nossos índios num leilão

Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?

  Essa música além de satirizar a situação do Brasil leva ao público uma indagação e reflexão, o que é também o intuito das cantigas de escárnio e maldizer.
   No trecho " Terceiro mundo se for piada no exterior / Mas o Brasil vai ficar rico / Vamos faturar um milhão / Quando vendermos todas as almas / Dos nossos índios num leilão " o autor satiriza o título do Brasil de "terceiro mundo" mostrando o quão longe o país está de ser uma grande nação. E ainda, assim como nas cantigas, o autor faz uma metáfora, essa refere-se ao passado histórico do Brasil.
   Nos últimos três versos vemos um tom irônico e sarcástico ao dizer que o Brasil vai ficar rico quando vender as almas dos índios, tendo os índios, metaforicamente, como o resquício de cultura totalmente brasileira que ainda possuímos. Ou seja, o autor critíca a idealização de um país de primeiro mundo "a qualquer custo".
   Conclusão, ainda vemos o tom "revolucionário" das cantigas de escárnio e maldizer nas músicas de hoje em dia. Músicas essas que também criticam diversas coisas que eram criticadas nas cantigas, como o governo, a forma de democracia e também pessoas isoladas. Ou seja, de uma forma ou de outra há uma grande influência nas músicas atuais por parte das cantigas do trovadorismo medieval.



Referência:
*Aulas ministradas pelo professor Fernando Fiorese na matéria Estudos Literários II, na UFJF.

Trovadorismo na atualidade: a Literatura de cordel

A poesia trovadoresca se apresenta em dois gêneros essenciais: o lírico amoroso e o satírico. As produções poéticas implicavam uma estreita aliança entre a poesia, a música, o canto e a dança. Daí o nome "cantiga", sempre com acompanhamento musical, mais precisamente, instrumentos de corda como viola, alaúde, harpa, saltério, entre outros. A presença de refrão, nessas poesias, atesta a presença de um coro e, por esse motivo, não podemos pensar nessas produções medievais sem o acompanhamento musical. As poesias nada mais são do que canções; versos cantados.

Já o nome "Literatura de Cordel" é derivado do fato de serem folhetos presos por um pequeno cordel ou barbante, em exposição nos lugares onde eram vendidos. Cabe ressaltar que, esse tipo de literatura também marcou a cultura francesa, onde era chamada de "littèrature de colportage". Na Espanha, eram os “pliegos sueltos” e em Portugal, “folhas volantes”. No local escolhido, o vendedor, em geral o próprio autor, declama ou canta em voz alta parte do texto para divulgar suas obras. Muitos poetas também fazem desafios, isto é, disputas em versos rimados feitos de improviso em que, alternadamente, inventam versos com os quais se auto-elogiam ou satirizam o cantador rival. 

O início da Literatura de Cordel está ligado à divulgação de histórias tradicionais (narrativas de velhas épocas) na Grécia antiga, na Europa Medieval, ou simplesmente na imaginação criadora dos povos e que a memória popular foi conservando, transmitindo. São os chamados romances de cavalaria, de amor, de crimes, de narrativas de guerras ou viagens, ou conquistas marítimas

Abaixo temos um exemplo da literatura de cordel. Nos versos de José Martins dos Santos, percebemos a crítica bem humorada aos costumes da “moça namoradeira”:


Aconselho às moças donzelas 
Que vivem na maganagem 
Que desprezem a malandragem 
E o namoro das janelas 
Vá lavar suas panelas, 
Talher, prato e frigideira, 
Tenho visto moça solteira 
Com os malandros abraçada 
Termina sendo falada 
A moça namoradeira. 
(...) 
Também moça que dança 
Se não quiser chumbregar 
Quando o rapaz lhe chamar 
Não deixe encostar a pança 
Se não o malvado avança 
E grita: eita madeira 
E chama prá ribanceira 
P’ra qualquer canto escuro 
Termina em mau futuro 
A moça namoradeira. 
(...)

O cordel acima, pode, de certa forma, ser comparado às cantigas de escárnio e de maldizer que apresentavam críticas a determinados costumes da sociedade - e esse é apenas um exemplo dentre muitos outros.


No Trovadorismo, os trovadores iam de castelos em castelos, cidades e cidades difundindo seus versos; suas cantigas. O mesmo acontece com a Literatura de Cordel: os cantadores ambulantes se encarregam de levar seus versos a outros lugares, cidades, feiras etc. Os cordelistas são os grandes narradores da vida local e cabe a eles a reprodução e a divulgação de fatos sociais, políticos, econômicos, etc. Tal como acontecia na Idade Média com os trovadores.


Referências:

ALGERI, Nelvi Malokowsky. A poesia trovadoresca e suas relações com a literatura de cordel e a música contemporânea. Disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_nelvi_malokowsky.pdf> Acesso em 26 de Setembro de 2016.

Cantiga de escárnio e maldizer

As cantigas de escárnio e maldizer foram censuradas por muito tempo — só apenas a partir da década de 50 que começaram a serem estudadas.

O foco dessas cantigas são as críticas, tendo destinos variados: desde pessoas comuns até pessoas, grupos sociais e políticos importantes, como os nobres. Mesmo que muitos não percebam, ou até mesmo não saibam, há importantes diferenças entre os dois tipos de cantigas.

A cantiga de escárnio é chamada de indireta, visto que não aparece o nome da pessoa criticada explicitamente. Tem um teor mais irônico e sarcástico. Nesse tipo de cantiga, o trovador faz críticas a alguma pessoa através de palavras de duplo sentido, metáforas e ambiguidades. Através de um processo denominado pelos trovadores de equívoco. 

Já a cantiga de maldizer é chamada de direta, pois até mesmo o nome da pessoa criticada pode aparecer, um apelido ou algo que a identifique. Seu tom é mais agressivo, muitas vezes contendo até palavras de baixo calão: assim autor expressa seu ódio pelo ser ou grupo criticado.

Muitos confundem cantigas de escárnio e maldizer com sátira, mas dizer que é a mesma coisa é um erro. Sátiras causam risos e cantigas de escárnio e maldizer nem sempre o causam.


Cantiga de maldizer

"Marinha, o teu folgar
tenho eu por desacertado,
e ando maravilhado
de te não ver rebentar;
pois tapo com esta minha
boca, a tua boca, Marinha;
e com este nariz meu,
tapo eu, Marinha, o teu;

com as mãos tapo as orelhas,
os olhos e as sobrancelhas,
tapo-te ao primeiro sono;
com a minha piça o teu cono;
e como o não faz nenhum,
com os colhões te tapo o cu.
E não rebentas, Marinha?"
(Afonso Eanes do Coton)


Cantiga de escárnio

"Ai, dona fea, fostes-vos queixar
que vos nunca louv[o] em meu cantar;
mais ora quero fazer um cantar
em que vos loarei toda via;
e vedes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!
Dona fea, se Deus mi pardom,
pois avedes [a]tam gram coraçom
que vos eu loe, em esta razom
vos quero ja loar toda via;
e vedes qual sera a loaçom:
dona fea, velha e sandia!
Dona fea, nunca vos eu loei
em meu trobar, pero muito trobei;
mais ora ja um bom cantrar farei,
em que vos loarei toda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!"
(João Garcia de Guilhade)

Referências:
*Aulas ministradas pelo professor Fernando Fiorese na matéria Estudos Literários II, na UFJF
<http://cseabra.utopia.com.br/poesia/poesias/0012.html> Acesso em: 26 set. 2016
<http://cantigas.fcsh.unl.pt> Acesso em: 26 set. 2016

Cantiga de Amigo - Parte II

Ainda tratando das Cantigas de Amigo — em que geralmente percebe-se a voz de uma mulher solitária, em contato com a natureza, sofrendo a dor do amor e lamentando a ausência do amado, — veremos a seguir uma se cantiga da autoria de El-rei D. Dinis e a sua tradução.

Ũa pastor se queixava
muit’estando noutro dia,
e sigo medês falava
e chorava e dizia com amor que a forçava:
“par Deus, vi-t’en grave dia,
ai amor!”

Ela s’ estava queixando,
come molher con gram coita
e que a pesar, des quando
nacera, non fôra doita,
por en dezia chorando!
“Tu non és se non mia coita,
ai, amor!”

Coitas lhi davam amores,
que non lh’eran se non morte,
e deitou-s’antr’ũas flores
e disse con coita forte:
“Mal ti venha per u fores,
ca non és se non mia morte,
ai, amor!”


Uma pastora estava a queixar-se
muito estando noutro dia,
e consigo mesmo falava
e chorava e dizia
com amor que a forçava:
“por Deus, vi-te em penoso dia,
ai amor!”

Ela estava se queixando,
como mulher com grande sofrer
e que apesar, desde quando
nascera, não fora ensinada,
porém dizia chorando!
“Tu és senão o meu sofrer,
ai, amor!”

Amores causavam-lhe sofrimentos,
que lhe eram como a morte,
e deitou-se entre umas flores
e disse com dor forte:
“Maldito sejas por onde fores,
porque não és senão minha morte,
ai, amor!”.

Nessa cantiga, o rei trovador fala primeiro um eu lírico que narra a queixa de uma pastora, e ao mesmo tempo a observa. A pastora, que se diz forçada pelo amor e se encontra de coração roubado, faz um monólogo sobre o amigo ausente que a faz sofrer. Essas características, não encontradas na imagem da mulher das cantigas de amor, apresentam certa sinceridade psicológica, em termos de fingimento poético, representando um pequeno esboço do sofrimento amoroso e da vida do campo. Dessa forma, a voz do eu lírico parece identificá-lo no mesmo ambiente ocupado pela pastora, como se estivesse vendo-a naquele instante do flagrante campesino ou como um narrador onisciente que capta e traduz a alma da personagem.

O nível das estruturas rítmicas tem relevância no nível de significado e podem fornecer a chave para uma tentativa de interpretação da cantiga. Distingue-se a presença de certa estrutura narrativa muito próxima da tradição oral pela presença repetitiva do termo aditivo “e”. A repetição desse termo além de dar ritmo à cantiga a aproxima da oralidade, garantindo a musicalidade natural da língua.

Referências:
NUNES, José Joaquim. Cantigas d’amigo dos trovadores galego-portugueses. Lisboa: Centro do Livro Brasileiro, 1973. 3 v.
<http://www.revistas2.uepg.br/index.php/uniletras/article/viewFile/4620/3163> Acesso em: 18 set. 2016

Cantiga de Amigo

A base do poema da cantiga de amigo é representada pelo sofrimento amoroso da mulher, geralmente pertencente às camadas populares (pastoras, camponesas e outras). Quer como altamente idealizada, enquanto dama da corte, quer como mulher do povo em ambiente rural ou urbano, ela geralmente foi retratada por um eu lírico, cuja voz feminina pautava-se submetida a um discurso de autoria masculina.

Especificamente nas cantigas, há uma voz do feminino que se mostra por meio um eu lírico que canta suas tristezas, sua solidão e suas emoções em relação ao amigo. Entretanto, a voz autoral pertence ao trovador, cujo imaginário se ramifica pela representação artística e pelo fingimento poético. Se na cantiga de amigo a voz autoral é masculina, deve haver, em razão da impossibilidade de uma absoluta transformação do eu no alter do outro, um comprometimento da visão do trovador acerca da mulher, relativamente às suas prerrogativas ideológicas e políticas. Sendo as coisas mimeticamente assim representadas, pensamos que alguma reflexão deve ser dedicada ao fato de as imagens ou topoi das cantigas de amigo (natureza, espaço, descrição física da amiga), cunhadas pelo trovador, poderem possuir um tratamento estilístico e retórico que se compromete com a visão androcêntrica e, portanto, possivelmente preconceituosa em termos misóginos.

Além disso, ao considerar a característica dualidade da mulher boa (virtuosa) e má (viciosa) no pensamento e na cultura medievais de herança patrística, é de se cogitar que as idealizações das cantigas de amor tendem para um retrato virginal e mariano da mulher. Ao passo que as cantigas de amigo, ainda seguindo o rescaldo negativo do platonismo, tendem a retratá-la mais realisticamente, portanto, de forma mais carnal e sensorializada: a sua face negativa enquanto corpo sinonimizado ao vício, à Eva propriamente dita.

Desse modo, as cantigas de amigo, interesse principal desta postagem, parecem representar mais fielmente esse segundo termo da dualidade. Já que esse tipo de cantiga traz elementos que permitem o trato da relação analógica entre concreto e profano, um exame mais detalhado dessa problemática da dualidade merece ser feito.

Referências:
NUNES, José Joaquim. Cantigas d’amigo dos trovadores galego-portugueses. Lisboa: Centro do Livro Brasileiro, 1973. 3 v.
<http://www.revistas2.uepg.br/index.php/uniletras/article/viewFile/4620/3163> Acesso em: 18 set. 2016

Uma ponte entre o medieval e contemporâneo?

Ao se tratar das cantigas medievais, por exemplo, questiona-se a existência de pontes entre essas antigas produções literárias e as produções contemporâneas no campo artístico como um todo. A questão primordial é: de que forma isso acontece? 

Tomando como exemplo a cantiga de amor, em que uma atmosfera suplicante preenche o poema do início ao fim, vê-se que o sofrimento do trovador é torturante. A presença da coita (sofrimento amoroso) é claramente perceptível. O trovador se consome num queixoso lamento por causa da sua “senhor”, é uma súplica apaixonadamente triste.

"Ai, mia senhor, lume dos olhos meus!
Hu vos non vir, dizede-mi, por Deus, 
Que farei eu, que vos sempre amei?

Pois m’assi vi, hu vos vejo morrer, 
Hu vos non vir, dizede-m’ua ren, 
Que farei eu, que vos sempre amei?

Eu, que nunca outrem soube servir
Se non, senhor, vós, e, hu vos non vir, 
Que farei eu, que vos sempre amei?"
(Fernan Fernandes Cogominho)


Contudo, sabemos que amor, saudade, rejeição e veneração são sentimentos universais, atemporais. Apenas as formas de expressá-los é que se modificaram na passagem do tempo. Mas, estão aí, presentes em nosso dia-a-dia em cada ser humano.

O tema do amor impossível, por exemplo, é recorrente em muitas manifestações artísticas, estando presente em todas as épocas. Podemos observar como isso acontece ao tomar conhecimento de um fragmento da letra de uma música do grupo Legião Urbana, que vem tratar justamente desse tema, o amor platônico:

"Eu sou apenas alguém
Ou ate mesmo ninguém
Talvez alguém invisível
Que a admira a distancia
Sem a menor esperança
 (...)
Você é o motivo
Do meu amanhecer
E a minha angústia
Ao anoitecer
(...)
Dono de um amor sublime
Mas culpado por querê-la
Como quem a olha na vitrine Mas jamais poderá tê-la
(...)
Eu sei de todas as suas tristezas E alegrias
Mas você nada sabe
(...)
Nem sequer que eu existo."

Este é apenas um dos exemplos que evidenciam claramente a correlação pertinente dos textos apresentados no blog com questões contemporâneas. É de fato claro que muitos outros exemplos poderiam ser mostrado aqui, visto a recorrência de temas e abordagens entre épocas diferentes. 


Referências Bibliográficas: 
ALGERI, Nelvi Malokowsky. A poesia trovadoresca e suas relações com a Literatura de Cordel e a Música Contemporânea. Disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_nelvi_malokowsky.pdf> Acesso em: 24 set. 2016


Cantiga de Amor

É inegável que há nas cantigas de amor galego-portuguesas uma avassaladora influência provençal. Não se trata de uma experiência sentimental a dois, mas de uma aspiração, sem correspondência, a um objeto inatingível, de um estado de tensão que, para permanecer, nunca pode chegar ao fim do desejo. Manter este estado de tensão parece ser o ideal do verdadeiro amador e do verdadeiro poeta como se o movesse o amor do amor, mais do que o amor a uma mulher. O trovador imagina a dama como um suserano a quem a servia numa atitude submissa de vassalo, confiando seu destino à senhora. (SARAIVA, p. 61).

A presença de atitudes mentais e arraigadas no passado registra a historicidade do homem, dá a dimensão dos legados de outrora que tanto influenciam o imaginário presente. Ser vassalo da amada, perceber-se só quando da ausência do ente amado, cantar o amor e sofrer pelo intangível são sentimentos atemporais, inerentes à época do Trovadorismo ou da Música Popular Brasileira (iniciada na década de 1960, em pleno período da Ditadura Militar no Brasil). Chico e Caetano cantam o amor assim como D. Dinis também cantava para sua amada. Os versos “Um amor assim tão delicado/ você pega e despreza/ não devias ter despertado/ ajoelha e não reza”, cantados por Caetano – da música Queixa – reacendem-se, portanto, do lírico de D. Dinis: “querede-vos de min doer/ e destes olhos meus, senhor/ que vos viron por mal de si,/ quando vos viron, e por mi.” (DOM DINIS, 2006, p. 24). Eis, aqui, os resíduos literários do medievo demarcados de modo explícito na MPB. Ser abandonado pela amada, sofrer por amor, não é um fato restrito à Idade Média; chega, pois, à música de Caetano séculos depois.

Cantar a realidade feminina – mesmo que sob a voz masculina – é a essência das cantigas de amigo: “Se saberes novas do meu amado,/ aquel que mentiu do que mi á jurado?/ ai, Deus, e u é?” (DOM DINIS, 1999, p. 155) e “Onde andará Nicanor?/ Tinha nó de marinheiro/ Quando amarrava um amor” – da música Nicanor –, de Chico Buarque, representam, em espaços temporais distintos, o cunho da afetividade, do amor sofrido, do querer o outro que está ausente. Querer o outro/ amado é um objeto de desejo quase intangível: a saudade massacra o coração, o vazio domina a alma e o sentimento aflora no peito a dor da ausência. O sofrimento da solidão e a busca pela completude de si mesmo atingem os céus: Deus é evocado para curar esse vazio, trazer o amado e confortar o ente saudoso. Dom Dinis quer “novas” do “amado” e Chico quer notícias de “Nicanor”, que “amarrava um amor”. Sentimentos aflorados e musicados nas cantigas de amigo – do Trovadorismo à MPB.

Este é um outro exemplo que evidencia a ponte existente entre as produções antigas medievais e a contemporaneidade, visto entre a cantiga de Dom Dinis e a música de Caetano Veloso — forte nome na MPB.

Referências:
<http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_nelvi_malokowsky.pdf > Acesso em: 23 set. 2016.
<http://www.undb.edu.br/publicacoes/arquivos/14_-_a_residualidade_literaria_das_cantigas_trovadorescas_na_musica_popular_brasileira.pdf> Acesso em: 23 de Setembro de 2016.
MOISÉS, Massaud. A Literatura Portuguesa através dos textos. 30. ed. São Paulo: Cultrix, 2006.
VELOSO, Caetano. Letras de músicas. Disponível em: <letras.terra.com.br/caetanoveloso/>. Acesso em: 23 set. 2016.